Não conhecemos senão as nossas sensações. O universo é pois um simples conceito nosso.
O universo porém - ao contrário de e em contraste com as nossas
fantasias e os nossos sonhos - revela, ao ser examinado, que tem uma
ordem, que é regido por regras sem exceção a que chamamos leis.
À parte isso, o universo, ou grande parte dele, é um conceito comum a
todos os que são constituídos como nós: isto é, é um conceito do
espírito humano.
O universo é considerado objetivo, real - por isso e pela própria constituição dos nossos sentidos.
Como objetivo, o universo é pois o conceito de um espírito infinito,
único que pode sonhar de modo a criar. O universo é o sonho de um
sonhador infinito e onipotente.
Como cada um de nós, ao vê-lo, ouvi-lo, etc., cria o universo, esse espírito infinito existe em todos nós.
Como cada um de nós é parte do universo, esse espírito infinito, ao
mesmo tempo que existe em nós, cria-nos a nós. Somos distintos e
indistintos dele.
A “Causa Imanente”, como é definida, tem que, ao criar, criar
infinitamente. Em si mesma é infinita como uma, extra-numericamente; nos
seres é infinita como inúmera, numericamente.
Num caso é o indivisível,
no outro infinitamente divisível. As almas são pois em número infinito.
Tudo o que é criado é infinito, pois a Causa Infinita não pode criar
senão infinito. Por isso tudo material, se tudo de natureza oposta à
Causa Infinita, é infinitamente divisível e multiplicável (eternidade do
tempo, infinidade do espaço).
Só pode criar finitos em número infinito.
Por isso tudo espiritual, isto é, não-espacial, como é da natureza da
Causa, é indivisível. É portanto imortal.
Fernando Pessoa, Textos Filosóficos
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