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Excesso de informações pode prejudicar memória e tomadas de decisões
Luciana Amaral - Especial para O Estado de S. Paulo
13 Outubro 2015 | 12h 15
O cérebro tem limite para ajudar na tomada de decisões. Com sobrecarga, relevância dos dados na memória podem se tornar confusos e paralisar a pessoa
Celular no bolso, computador no
trabalho, televisão em casa e todos sempre de olho no que está
acontecendo ao redor. A população vive conectada, mas, segundo o
cardiologista Carlos Alberto Pastore, em entrevista ao programa Rota
Saudável, da Rádio Estadão, o excesso de informações pode prejudicar o
bom funcionamento do cérebro e causar danos à memória e às tomadas de
decisões.
"Não
há dúvida de que a aquisição de informações aumentou em um volume
exponencial e o cérebro não está dando mais conta. A nossa memória passa
a não ser mais tão confiável e somos obrigados a decidir a cada
instante. O que os cientistas estão percebendo é que o cérebro tem um
limite para tomar decisões e, pior ainda, não determina prioridades."
De acordo com o médico, até atividades aparentemente simples, como resolver transações bancárias e comprar passagens aéreas pela internet, podem levar a uma exaustão. "Você acha lindo fazer tudo pela internet, mas é você quem está trabalhando em função disso e tem que ser muito ágil e rápido.
Essas informações realmente tomam um trabalho mental enorme. Depois a gente reclama que tem crise de pânico, depressão, ansiedade. Não tem jeito. O espaço mental tem limite."
Um estudo deste ano encomendado pela empresa de segurança cibernética Kaspersky Lab diz que as pessoas estão sofrendo de "amnésia digital". Segundo o trabalho, o fenômeno acontece quando se esquece de uma informação, pois há a confiança de que ela está armazenada em um aparelho digital e será lembrada para você.
A pesquisa contou com 6 mil homens e mulheres entre 16 e 55 anos em oito países europeus. Ao contrário do que se possa imaginar, a amnésia não afeta os jovens e nativos digitais em maior proporção. Às vezes, as pessoas mais velhas foram mais atingidas.
Entre os participantes adultos, cerca de 60% se lembraram do telefone da casa em que viviam quando tinham 10 anos, mas não dos números dos filhos ou do trabalho sem antes olhar em algum aparelho. Um terço deste total não se recordava do telefone do cônjuge.
A maioria dos entrevistados, ou 79,5%, admitiu que usa a internet como uma extensão do cérebro, porém, se esquecer de uma informação não é necessariamente ruim para eles. O estudo mostrou que 30% das pessoas não se importam em perder dados desde que possam achar tudo online de novo. Entretanto, as mulheres e os jovens são os grupos que mais ficariam tristes se perdessem esse conteúdo, em especial porque grande parte das memórias armazenadas nos aparelhos digitais nunca poderiam ser recuperadas.
Quando confrontados com alguma pergunta, 36% iriam procurar a resposta na web antes de tentar lembrar-se dela e 24% se esqueceriam de uma informação que aprenderam online assim que fosse utilizada.
Filtro. O psiquiatra Mário Louzã, do Hospital das Clínicas em São Paulo, afirma que o grande desafio é saber selecionar o que interessa. "A informação tem que ser metabolizada para se tornar conhecimento. Tem de haver um filtro. Nosso sistema de memória a arquiva conforme a importância", diz.
Ele explica que toda atitude implica em uma análise e a tomada de uma conduta adequada perante os dados que se tem. Se o cérebro encontrar dificuldade nesse processo, a pessoa fica paralisada. "O que faz com que a gente decida é a relevância das informações."
Louzã diz que os estudos feitos até hoje são inconclusivos para saber se uma eventual sobrecarga chega a causar transformações físicas no sistema nervoso, mas é possível perceber perdas e ganhos de habilidades devido a hábitos. Um exemplo é a facilidade das crianças mexerem em smartphones e jogos eletrônicos, porém, com a perda da capacidade de brincar com objetos sem representações definidas e fantasiá-los em um universo lúdico.
Para evitar esgotamentos, quando uma pessoa fica excessivamente estressada podendo gerar inclusive sintomas físicos, Pastore recomenda um desligamento da rotina. "Acho que temos que criar algumas situações em que você se afasta. Eu chamo de reset cerebral. É você andar em um lugar e sair do circuito, às vezes mudar de ares durante o fim de semana."
Clube do Nadismo. Um espaço em que pessoas se reúnem para fazer nada: essa é a proposta do Clube do Nadismo, que conta com 7 mil 'sócios'. Criado em 2004 pelo designer Marcelo Bohrer, em Porto Alegre, após este sofrer uma estafa, o clube busca oferecer um momento em que os interessados possam relaxar sem se preocupar com o cotidiano.
"São eventos para desfrutar o prazer de não fazer nada. São encontros públicos e gratuitos, em geral, uma vez por mês em parques. Por uma hora, todos fazem nada. Não tem regras, um jeito certo. Não é como a meditação em que há técnicas. Incentivamos que desliguem o celular e evitamos conversar", explica Bohrer, que era proprietário de uma marca de roupas e costumava fazer mais de uma atividade ao mesmo tempo quando foi parar no hospital. "A gente sempre acha que consegue dar conta.
Comia dirigindo, mexia no celular quando parava no semáforo, dormia menos do que o necessário. O médico disse que eu não tinha nenhum problema a não ser o ritmo de vida agitado. Então, aderi ao movimento slow."
O publicitário Marcos Rodrigues leva uma "vida frenética", pois faz parte de um coletivo de ocupação urbana, uma pós-graduação na Universidade de São Paulo (USP), um curso no Museu da Imagem e do Som e ainda colabora com uma Organização Não Governamental (ONG) nos fins de semana. Mesmo assim, resolveu desacelerar com pequenas medidas após sentir que estava chegando ao limite. "Comecei a perceber que quanto mais ficava quieto, mais produzia. Tentei ficar mais calmo.
É uma autoconsciência, é perceber que está se suicidando lentamente. Alcancei isso com a maturidade por meio da música, lendo, indo para o sítio e evitar ficar virando noites. Ainda não estou no ideal, fumo como uma vaca, mas estou tentando", conclui.
De acordo com o médico, até atividades aparentemente simples, como resolver transações bancárias e comprar passagens aéreas pela internet, podem levar a uma exaustão. "Você acha lindo fazer tudo pela internet, mas é você quem está trabalhando em função disso e tem que ser muito ágil e rápido.
Essas informações realmente tomam um trabalho mental enorme. Depois a gente reclama que tem crise de pânico, depressão, ansiedade. Não tem jeito. O espaço mental tem limite."
Um estudo deste ano encomendado pela empresa de segurança cibernética Kaspersky Lab diz que as pessoas estão sofrendo de "amnésia digital". Segundo o trabalho, o fenômeno acontece quando se esquece de uma informação, pois há a confiança de que ela está armazenada em um aparelho digital e será lembrada para você.
A pesquisa contou com 6 mil homens e mulheres entre 16 e 55 anos em oito países europeus. Ao contrário do que se possa imaginar, a amnésia não afeta os jovens e nativos digitais em maior proporção. Às vezes, as pessoas mais velhas foram mais atingidas.
Entre os participantes adultos, cerca de 60% se lembraram do telefone da casa em que viviam quando tinham 10 anos, mas não dos números dos filhos ou do trabalho sem antes olhar em algum aparelho. Um terço deste total não se recordava do telefone do cônjuge.
A maioria dos entrevistados, ou 79,5%, admitiu que usa a internet como uma extensão do cérebro, porém, se esquecer de uma informação não é necessariamente ruim para eles. O estudo mostrou que 30% das pessoas não se importam em perder dados desde que possam achar tudo online de novo. Entretanto, as mulheres e os jovens são os grupos que mais ficariam tristes se perdessem esse conteúdo, em especial porque grande parte das memórias armazenadas nos aparelhos digitais nunca poderiam ser recuperadas.
Quando confrontados com alguma pergunta, 36% iriam procurar a resposta na web antes de tentar lembrar-se dela e 24% se esqueceriam de uma informação que aprenderam online assim que fosse utilizada.
Filtro. O psiquiatra Mário Louzã, do Hospital das Clínicas em São Paulo, afirma que o grande desafio é saber selecionar o que interessa. "A informação tem que ser metabolizada para se tornar conhecimento. Tem de haver um filtro. Nosso sistema de memória a arquiva conforme a importância", diz.
Ele explica que toda atitude implica em uma análise e a tomada de uma conduta adequada perante os dados que se tem. Se o cérebro encontrar dificuldade nesse processo, a pessoa fica paralisada. "O que faz com que a gente decida é a relevância das informações."
Louzã diz que os estudos feitos até hoje são inconclusivos para saber se uma eventual sobrecarga chega a causar transformações físicas no sistema nervoso, mas é possível perceber perdas e ganhos de habilidades devido a hábitos. Um exemplo é a facilidade das crianças mexerem em smartphones e jogos eletrônicos, porém, com a perda da capacidade de brincar com objetos sem representações definidas e fantasiá-los em um universo lúdico.
Para evitar esgotamentos, quando uma pessoa fica excessivamente estressada podendo gerar inclusive sintomas físicos, Pastore recomenda um desligamento da rotina. "Acho que temos que criar algumas situações em que você se afasta. Eu chamo de reset cerebral. É você andar em um lugar e sair do circuito, às vezes mudar de ares durante o fim de semana."
Clube do Nadismo. Um espaço em que pessoas se reúnem para fazer nada: essa é a proposta do Clube do Nadismo, que conta com 7 mil 'sócios'. Criado em 2004 pelo designer Marcelo Bohrer, em Porto Alegre, após este sofrer uma estafa, o clube busca oferecer um momento em que os interessados possam relaxar sem se preocupar com o cotidiano.
"São eventos para desfrutar o prazer de não fazer nada. São encontros públicos e gratuitos, em geral, uma vez por mês em parques. Por uma hora, todos fazem nada. Não tem regras, um jeito certo. Não é como a meditação em que há técnicas. Incentivamos que desliguem o celular e evitamos conversar", explica Bohrer, que era proprietário de uma marca de roupas e costumava fazer mais de uma atividade ao mesmo tempo quando foi parar no hospital. "A gente sempre acha que consegue dar conta.
Comia dirigindo, mexia no celular quando parava no semáforo, dormia menos do que o necessário. O médico disse que eu não tinha nenhum problema a não ser o ritmo de vida agitado. Então, aderi ao movimento slow."
O publicitário Marcos Rodrigues leva uma "vida frenética", pois faz parte de um coletivo de ocupação urbana, uma pós-graduação na Universidade de São Paulo (USP), um curso no Museu da Imagem e do Som e ainda colabora com uma Organização Não Governamental (ONG) nos fins de semana. Mesmo assim, resolveu desacelerar com pequenas medidas após sentir que estava chegando ao limite. "Comecei a perceber que quanto mais ficava quieto, mais produzia. Tentei ficar mais calmo.
É uma autoconsciência, é perceber que está se suicidando lentamente. Alcancei isso com a maturidade por meio da música, lendo, indo para o sítio e evitar ficar virando noites. Ainda não estou no ideal, fumo como uma vaca, mas estou tentando", conclui.
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